O Mounjaro, medicamento injetável da farmacêutica Eli Lilly, obteve aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para o tratamento de sobrepeso e obesidade no Brasil. A decisão, publicada no Diário Oficial da União na última segunda-feira, representa um avanço para aproximadamente 25% da população brasileira que convive com a obesidade, oferecendo uma nova perspectiva para o controle da condição de saúde.
A autorização da Anvisa para diferentes dosagens da caneta injetável do Mounjaro complementa uma aprovação anterior, que já permitia o uso da substância para pacientes com diabetes tipo 2. O medicamento, à base de tirzepatida, já é empregado nos Estados Unidos e demonstrou resultados promissores em estudos clínicos internacionais. Uma das pesquisas mais abrangentes, o estudo Surmount, envolveu mais de 20 mil pacientes em nove países e revelou que usuários da dose mais alta (15 mg) alcançaram uma redução de até 22,5% do peso corporal, contrastando com 0,3% no grupo placebo. Esses dados foram apresentados em um congresso nos Estados Unidos no ano passado.
Avanço no tratamento e ação hormonal
A endocrinologista Aline Feitosa, especialista do Centro de Prevenção e Tratamento da Obesidade do Hospital Santa Izabel, destaca que medicações como a tirzepatida, presente no Mounjaro, e a semaglutida (princípio ativo de Ozempic e Wegovy) simulam hormônios como GLP-1 e GIP. Estes hormônios atuam no cérebro promovendo saciedade e desacelerando a digestão, além de estimular a produção de insulina. Feitosa ressalta a particularidade do Mounjaro, que possui uma “ação dual” em dois receptores, resultando em uma perda de peso mais significativa, entre 20% e 25%, patamares antes observados apenas em procedimentos como a cirurgia bariátrica.
“Entendemos a obesidade como uma doença crônica e mesmo que o paciente perca peso ele é um obeso controlado, então a possibilidade de um tratamento efetivo sem cirurgia é muito animador”, afirmou a médica.
Alertas e desafios no uso do medicamento
Apesar do entusiasmo com a chegada de novas opções terapêuticas, o mercado de medicamentos para perda de peso enfrenta desafios. O sucesso do Mounjaro tem gerado preocupações com a indicação inadequada, contrabando e falsificação. Embora a produção nacional do Mounjaro, que já levou a uma redução no preço da dose inicial de 2,5 mg de cerca de R$ 2,5 mil para aproximadamente R$ 1,6 mil, possa atenuar o contrabando, a Dra. Aline Feitosa alerta para o uso indiscriminado. Ela enfatiza que esses fármacos não são indicados para quem busca uma pequena perda de peso e podem causar efeitos adversos como náuseas, vômitos e diarreias.
“Já recebemos pacientes com quadros graves de vômitos persistentes, semi obstrução intestinal, refluxo e até desidratação”, alertou a endocrinologista.
A prescrição é recomendada para pacientes com diabetes ou obesidade clínica (IMC superior a 30, ou IMC a partir de 27 com comorbidades, como doenças cardíacas).
Regulamentação e futuro no SUS
A venda do Mounjaro exige retenção da receita médica nas farmácias, medida considerada importante para o acompanhamento do tratamento, que tem aplicação semanal e doses progressivas de 2,5 mg até 15 mg. Paralelamente, no mesmo dia da aprovação do Mounjaro, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) abriu consulta pública para avaliar a inclusão da semaglutida, outro medicamento da mesma classe (Wegovy 2,4 mg), no rol do Sistema Único de Saúde (SUS). A população e a classe médica podem se manifestar até 30 de junho. Esta avaliação ocorre após uma recusa inicial do governo devido aos elevados custos, estimados em R$ 7 bilhões em cinco anos. A farmacêutica Novo Nordisk, que solicitou a análise, argumenta que a incorporação pode gerar economia com a redução de tratamentos de doenças crônicas associadas à obesidade. A expiração da patente da semaglutida no próximo ano deverá impulsionar a disponibilidade de medicamentos genéricos com custos mais acessíveis.